terça-feira, 31 de maio de 2011

Um “manézinho” chamado Gay Talese

Gay Talese, com seu olhar, têm os moldes para enxergar os despercebidos do terminal Rodoviário Rita Maria de Florianópolis

Nos textos de Gay Talese é possível perceber que os esquecidos não têm relevância na sociedade. O valor estético do texto aponta detalhes de animais e pessoas esquecidas em Nova York e também mostra as características dos personagens expostos de uma forma excêntrica.

O autor trabalha com dados, números e estatísticas. Mostra os detalhes dos personagens, como as qualidades e defeitos de um porteiro. Na rodoviária Rita Maria, em Florianópolis, também há um personagem que faz o papel do porteiro das reportagens de Gay Talese, mas o porteiro da Ilha da Magia permanece obscuro dentro de uma guarita de estacionamento.

O medo de não conseguir exercer a função corretamente, medo de ser surpreendido por um assaltante, enfim, o medo de não voltar pra casa. Isto é o que Carlos Alberto Pereira, de 54 anos, declara conviver diariamente. Trabalhando há três meses na recepção da rodoviária Rita Maria de Florianópolis, Carlos relata ser normal o convívio com ameaças e com o medo. Mas o curioso é que sua presença só é notada, na maioria das vezes, por pessoas que pedem favores ou que podem lhe passar perigo. A sua presença é vista de uma forma robótica por cerca de dois mil carros que adentram ao local diariamente.

Cenas de sexo, ameaças, brigas, roubos e drogas são assuntos recorrentes na vida de Vilson Adelino de Espíndola. Com 28 anos, o fiscal de operações do Departamento de Transportes e Terminais (Deter) no terminal Rita Maria, acredita que as pessoas que estão neste mundo obscuro da rodoviária, são vitimas da marginalidade que batalha e busca um pouco de dinheiro em troca do seu vicio. O fiscal completou seu pensamento com a seguinte frase: “É preciso respeitar o mundo dos despercebidos”.

Andar pela rodoviária é perceber um leque de cores, iluminações e aspectos de ilusão. A parte externa do terminal contém um cenário escuro e carrega um ar sombrio. A parte interior, onde fica a plataforma de embarque e desembarque, apresenta uma boa iluminação e uma estrutura que faz o papel de uma mãe, a mãe Rita Maria, que oferece aos moradores de rua, aos despercebidos, um local para protegerem-se do frio, para usar os banheiros e para conseguir uma possível alimentação.

Gay Talese também explora a iluminação e o jogo de cores da cidade à noite para caracterizar seus cenários. O trabalho com a imaginação e a ilusão tem como exemplo os manequins que são produzidos de acordo com uma beleza padrão e esbelta. A inspiração dos nova-iorquinos por manequins é como um desejo por uma jovem virgem, só que sintética.

A imagem e o espírito de Rita Maria ainda têm um aspecto muito vivo dentro da rodoviária. As faxineiras limpam o local sem qualquer intervenção física. Aliás, a presença delas, não tem significado visual para os frequentadores do terminal rodoviário. Espreitando o terminal de chegada e de partida, o espírito de Rita Maria parece pairar sobre a estrutura alta e metálica. Isso é o que garante a faxineira Marizete Simão Pereira, casada, 46 anos, e totalmente crente na história de ter visto os pés de Rita Maria na sexta-feira santa, enquanto limpava o chão perto dos banheiros.

Na frente do terminal, a imagem de Rita Maria está destacada com uma grande estátua, mas a iluminação, embora precária, não esconde os descuidos nos reparos da estrutura externa, deixando a obra de arte em um completo abandono. Na estátua é possível ver uma venzedura deixada por Rita Maria em setembro de 1982. “Deus é sol, Deus é lua, Deus é a Claridade. Deus é as três pessoas da santíssima trindade. Sai sol, sai sol, sai sol. Em nome de Deus e da Virgem Maria”.

No mundo dos despercebidos de Gay Talese, a cidade de Nova York, lugar populoso, com grandes empresas, grandes profissionais, mas com um trânsito infernal, onde os animais não têm vez, os lixeiros não têm vez, os policiais camuflados na multidão são guardas inofensivos, os moradores de rua que são fortemente esquecidos e jogados ao chão, fazem papel de meros figurantes. A cidade é saturada de uma poluição visual e sonora, onde o olhar de uma pessoa corre como se estivesse cego. O que parece marginal à sociedade padronizada, não tem espaço em Nova York, é intensamente esquecido. Os cenários de uma metrópole camuflam o valor dos esquecidos.

Em Florianópolis, um artista, com uma inteligência fora de série, uma simpatia e um carisma invejável. Este é o morador de rua, Marcelo, nascido em São José do Rio Preto, São Paulo, tem 35 anos e é pai solteiro. Transferiu-se para Santa Catarina visando encontrar o seu mundo. Fazendo uma breve reflexão, Marcelo afirmou que não precisa de nada, além do que, sua alimentação diária e sua roupa do corpo. O resto de sua felicidade, ele demonstra nos rabiscos de um papel. Fazendo desenhos com uma alusão aos seis continentes, Marcelo fala um pouco sobre o iluminismo e demonstra conhecimento no assunto. “Eu gosto de basear meus desenhos no iluminismo, por que foi um movimento científico e intelectual ocorrido no século XVIII e representou a transição do pensamento medieval para o pensamento moderno. Esse movimento buscava o racionalismo e condenava o absolutismo, o abuso da Igreja, a Intervenção do Estado na economia, à propriedade privada e tudo que se opunha ao progresso e ao desenvolvimento”, explicou o artista.

Gay Talese traduz a emoção com uma riqueza de informações e busca sensibilizar o leitor, mostrando a igualdade entre as pessoas. Caracteriza a realidade atual e cruel para alertar e incentivar a mudança nesse aspecto negativo. O valor de um morador de rua é o mesmo valor de um empresário, de um animal abandonado para um cachorrinho de uma senhora, todos têm sentimentos e merecem uma vida conveniente. Esta é uma mensagem ética e o principal fio condutor da reportagem “Nova York, é uma cidade dos despercebidos”, de Gay Talese.

Um olhar diferenciado, uma visão complexa e inteligente do “manézinho” Gay Talese. “Mané” por que conseguiu mostrar-me através de suas leituras de vida o que significa Florianópolis. Ensinou-me a valorizar os despercebidos, enxergar o irreal. Um norte-americano, fora de série, conhecia Florianópolis muito antes de eu pisar na Ilha da Magia.
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Ericky Maier é natural de Braço do Norte (SC), tem 19 anos, e está graduando o quinto período da faculdade de Jornalismo na Unisul. Possui curso de Jornalismo Esportivo na Faculdade Cásper Líbero (SP). Em 2009, escreveu sobre automobilismo para o portal http://contato.net e, em 2010, fez à cobertura das eleições para o site: http://www.unisul.br/unisulhoje. Em 2011, fez participações como comentarista no programa “Papo de Bola” da TVN. Atualmente, escreve e participa do programa “Craque do Futuro” do diário Lance! Ericky Maier é responsável por escrever tudo o que acontece no esporte de Santa Catarina para o portal do Esporte Interativo, que recebe milhares de acessos todos os dias. Além disso, também é Editor Chefe do jornal “O Regional” e repórter do Futebol Emoção da Rádio Regional FM.

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